A Câmara Municipal de Natal realizou nesta sexta-feira (14), uma audiência pública para debater e promover a doação de órgãos na capital potiguar. Com o tema “Super-humanos: vidas que doam vidas. A atual realidade do transplante de órgãos em Natal”, o evento foi promovido pelo vereador Cláudio Custódio (PV), e contou com a participação de médicos especialistas em transplantes, coordenadoras de centrais reguladoras, membros de ONGs e pessoas transplantadas. O próprio parlamentar tem experiência no assunto pois, há 10 anos, ele doou parte do seu fígado por vontade própria para um rapaz, Matheus Leandro, que sofria de insuficiência hepática.
A doação realizada pelo vereador, entretanto, é uma exceção às adversidades encontradas no sistema de doação e captação de órgãos para transplantes, as quais foram trazidas por ele para o debate. “Existem alguns gargalos em relação à doação de órgãos, não só aqui como no Brasil inteiro. Um desses pontos é a comunicação entre os hospitais e a Central de Transplantes de órgãos. Para isso, nós trouxemos a responsável pelo setor na Secretaria de Saúde Pública do Estado (SESAP), Dra. Rogéria Medeiros, para justamente esclarecer como nós podemos viabilizar um maior diálogo, efetivar treinamentos, para que haja maior eficiência na doação de órgãos no nosso município e consequentemente no nosso estado”, explicou Cláudio Custódio.
Segundo Rogéria Medeiros, coordenadora da Central de Transplantes do Rio Grande do Norte, o estado possui uma fila de espera para a doação de órgãos de mais de 900 pessoas. O principal problema enfrentado dentro do sistema é a subnotificação dos óbitos ocorridos no estado. “Muito se fala sobre a negativa das famílias em realizar a doação de um ente falecido, mas é o contato entre o hospital e a Central de Transplantes que precisa ser melhorado. São mais de 4 mil óbitos por ano no estado que, se notificados, ampliariam o contato da nossa equipe com as famílias e, consequentemente, aumentariam os números de transplantes”, declarou.
O ponto de vista é compartilhado pelo médico urologista e chefe da unidade de transplantes do Hospital Universitário Onofre Lopes, Paulo Medeiros. Segundo ele, o diagnóstico de morte cerebral, essencial para o processo de doação e transplante, enfrenta dificuldades práticas devido à superlotação dos hospitais e ao baixo número de profissionais. “É comum termos um diagnóstico para a captação, mas a equipe não tem condições de entrar em contato com a Central de Transplantes, porque o leito precisa ser disponibilizado com urgência para uma outra pessoa, não dando condições para que o trabalho junto à família possa ser feito da maneira ideal”, apontou o médico.
Por outro lado, Medeiros reforçou o papel da família na doação de órgãos e a necessidade de a pessoa deixar expressa sua vontade ainda em vida. “O Brasil tem uma média de 20 doadores de órgãos por milhão de habitantes. No Rio Grande do Norte, esse número cai para 10 doadores por milhão. Então a gente precisa falar sobre isso. É fundamental que qualquer pessoa que tenha essa vontade de ser doador fale em casa, fale com os familiares, porque com certeza vai facilitar uma situação, vai facilitar uma entrevista da Central com a família. Quando a família sabe que a pessoa, em vida, diz assim, ‘eu sou um doador’, com certeza absoluta vai ser mais fácil para uma mãe, para o pai, para uma esposa dizer ‘vamos doar’”, ressaltou Dr. Paulo Medeiros.
A audiência pública teve como encaminhamentos a proposta de criação de um Núcleo Municipal de Apoio a Pacientes em Fila de Transplante, a indicação para instituir um Programa Municipal de Conscientização sobre Doação de Órgãos e a proposição de um Dia Municipal da Família Doadora de Órgãos e Tecidos, a ser celebrado em setembro, resultado de um projeto de lei que o vereador Cláudio Custódio. “Quando o assunto é doação de órgãos, não existe esquerda ou direita. Existe vida. E a vida não pode esperar”, concluiu o Professor Cláudio Custódio
Texto: Cleber Femina
Fotos: Otávio Augusto